Tuesday, August 3, 2010

O sistema de ensino finlandês vs português: «UM FILME DO OUTRO MUNDO», por Marcelo Rebelo de Sousa

O Sistema de Ensino na Finlândia:

É impossível não tomar como referência o sistema de ensino de um país cujas tradições democráticas devem ser um exemplo para todos os países europeus, e não só, e cujo o nível de literacia da população ascende, virtualmente, aos 100%.

Ainda que a sua organização formal se apresente muito similar à portuguesa, o grau de eficácia do sistema de ensino finlandês é bastante elevado, sendo que 56% da população acima dos 15 anos completa o ensino secundário.

Assim sendo, não é o aspecto formal do sistema de ensino finlandês que o torna um exemplo a este nível e que justifica o crescente número de estudantes estrangeiros que procuram as suas instituições. Que outras hipóteses então, senão as políticas educativas e o grau de comprometimento estatal para com a educação da população? O grau de eficácia do sistema educativo finlandês não pode ter senão a ver com o facto de estarmos a falar de um dos países com a taxa mais alta de dinheiros públicos investidos na educação (entre os países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento na Europa), com um grau de comprometimento relativamente à educação de adultos absolutamente notável, e com um investimento na internacionalização que em muito ultrapassa o português (os finlandeses têm neste momento cerca de 300 cursos leccionados em inglês).

Em traços gerais, o sistema educativo finlandês agrupa a escolaridade obrigatória, o ensino secundário geral e profissional, o ensino superior e a educação de adultos. A escolaridade obrigatória consiste num programa educacional de 9 anos para todas as crianças em idade escolar que tem o seu início aos sete anos. O ensino secundário está dividido entre as escolas secundárias gerais (três anos , que terminam com a realização de um exame) e as escolas profissionais (três anos, que conferem qualificações profissionais básicas).

Relativamente ao Ensino Superior, ele é neste momento, assegurado por 20 universidades e 33 institutos politécnicos. Actualmente, as escolas profissionais têm ainda programas de estudo que conferem aos estudantes uma qualificação profissional superior, no entanto, a tendência é para que este sistema seja progressivamente desmantelado, passando estes cursos a ser, única e exclusivamente, da competência dos Institutos Politécnicos.

Uma das características do sistema educativo finlandês é a aposta cada vez maior na educação ao longo da vida. Todas as universidades finlandesas têm neste momento um centro de formação contínua, que gere cursos de formação profissional, e universidades abertas. Este tipo de formação profissional não confere nenhum grau específico, no entanto, a actualização de conhecimentos que este tipo de curso permite, bem como os diplomas que são entregues aos estudantes, são amplamente valorizados pelos empregadores.

Ao nível do ensino superior, assiste-se a um crescente empenho no fortalecimento das relações com o exterior, nomeadamente com os países da União Europeia, da qual a Finlândia faz parte desde 1995. Aliás, já antes de serem membros de pleno direito da U.E, os finlandeses participavam (desde 1990) em Programas Comunitários para a Educação e Formação Profissional, sendo a sua participação em Sócrates e Leonardo da Vinci as manifestações mais claras deste envolvimento.

No entanto, não podemos deixar de salientar que os laços mais fortes de cooperação a este nível (e outros) se verificam com os países nórdicos, através do Programa Nordplus.

Há ainda outro aspecto que convém salientar relativamente à aposta da Finlândia na internacionalização da educação e que diz respeito ao número crescente de programas de estudo totalmente leccionados em Inglês. De facto, isto não pode deixar de acontecer quando um país com uma das línguas menos faladas da Europa pensa em apostar seriamente na internacionalização da sua educação.

É o Parlamento finlandês que aprova as leis relativas ao sistema de ensino e decide sobre os princípios gerais da política de educação. O Governo e o Ministério da Educação estão encarregados de implementar estes princípios ao nível central. Em todas as questões que digam respeito à escolaridade obrigatória, ao ensino secundário, às instituições de formação profissional e à educação de adultos, o Ministério é aconselhado pelo Conselho Nacional de Educação.

Quase todas as instituições públicas (financiadas pelo Governo), desde o ensino primário ao ensino superior, são controladas pelo Ministério da Educação, no entanto, convém salientar que em algumas áreas específicas, como sejam as relacionadas com a defesa nacional e o direito, as instituições são administradas pelos ministérios relevantes. A maior parte das instituições de ensino privadas são de formação profissional, no entanto, elas têm também uma parte considerável de financiamento público e estão, igualmente, sujeitas a controlo por parte do Governo.

As universidades são financiadas directamente através do Orçamento de Estado, enquanto que o financiamento das outras instituições provém essencialmente das autoridades locais.

Sendo um pais bilingue, existe formação em finlandês e em sueco em todos os níveis de ensino. Para além disso, existem ainda, escolas suecas ao nível do ensino básico, secundário e profissionais suecas.

Ainda que a língua de ensino na maior parte das universidades seja o finlandês, os cidadãos cuja língua mãe é o sueco têm o direito de a utilizar nos exames, trabalhos e teses. Existem ainda duas universidades e quatro politécnicos cujos planos de estudo são totalmente leccionados em sueco.

O fenómeno da internacionalização reforçou a necessidade de se apostar no desenvolvimento do ensino do inglês em todos os níveis de ensino. Existe a possibilidade de, ao nível do ensino superior, se frequentarem cursos totalmente leccionados em Inglês, ainda que estes requeiram um bom conhecimento de finlandês e sueco. Em muitos cursos o conhecimento destas línguas é mesmo uma condição de ingresso para todos os candidatos. Mesmo os estudantes estrangeiros são obrigados a frequentar cursos de finlandês (ou sueco) para apoiar os seus estudos. No que diz respeito aos doutoramentos, eles podem na maior parte dos casos ser realizados com sucesso em inglês.

Os objectivos gerais definidos já há muito pelo Governo relativamente ao sistema de ensino passam por elevar o nível e o padrão de educação, bem como por promover a igualdade no seio do sistema de ensino. Aliás, ao longo dos últimos anos, têm vindo a ser feitos esforços crescentes tendo em vista proporcionar igualdade de oportunidades a toda a população em idade escolar e de todas as regiões do país.

Estas são, aliás, as motivações básicas que levaram às reformas educacionais implementadas nos últimos anos (a reforma do ensino básico e da educação profissional, a regionalização/expansão da rede universitária e a criação dos institutos politécnicos).

Além destas prioridades, tem também sido prestada especial atenção aos curricula e aos métodos de ensino num esforço de aumentar a flexibilidade e reforçar as oportunidades de escolha individual. Tem sido evidente que todas as reformas propostas pelo Governo vão no sentido de reforçar o sistema de ensino de acordo com o princípio da educação ao longo da vida, tornando-o internacionalmente competitivo.

O Ensino Superior

Todas as reformas propostas pelo Governo relativamente ao ensino superior têm sido determinadas por questões que não afectam apenas a Finlândia, mas que se fazem sentir um pouco por toda a Europa, e entre as quais se destacam a necessidade de investir na investigação em determinados sectores chave, de adaptação das instituições às constantes mudanças no mercado de trabalho e de tornar o financiamento das instituições cada vez mais racional.

Nos finais de 1995, o Governo, ao definir as linhas gerais de acção para o sistema educativo até ao ano 2000, manifestou a intenção de apostar na Educação e na Investigação, considerando-as como cruciais para a estratégia global do país, cujos objectivos máximos são o bem-estar dos cidadãos, a promoção da diversidade cultural, o desenvolvimento sustentável e a prosperidade.

Os grandes objectivos para os próximos anos, tal como foram definidos pelo Governo para este nível de ensino, são a promoção da qualidade, a igualdade de oportunidades e a educação ao longo da vida. No campo da investigação a grande aposta será também a qualidade, a ética, a liberdade de investigação e o equilíbrio entre a investigação pura e a investigação aplicada. Salvaguardar o desenvolvimento harmonioso dos mecanismos de inovação é também fundamental para se conseguir melhorias na economia e na situação de desemprego que afecta actualmente o país.

Definiram-se, assim, o princípio da educação ao longo da vida, a resposta às mudanças no mercado de trabalho, a internacionalização e o ensino de línguas estrangeiras como as grandes traves mestras da política educativa para o ensino superior nos próximos anos.

Todos os esforços têm vindo a ser feitos no sentido de disponibilizar as condições necessárias para uma investigação de qualidade e para a formação dos investigadores e cientistas do futuro. Condições de adaptabilidade e flexibilidade na investigação e na educação, bem como o apoio a instituições de ensino nas áreas em que elas se destacam, vão assim preparar o terreno para que a educação e investigação possam atingir padrões máximos de qualidade. Será então reforçado o financiamento de novas unidades e actividades de investigação nas áreas mais relevantes. O apoio será também maior para todos os jovens investigadores que queiram prosseguir doutoramentos e serão igualmente promovidos projectos de investigação conjuntos entre as instituições de ensino e o mundo empresarial.

As rápidas transformações ocorridas no mercado de trabalho têm exigido uma constante adaptação das universidades e dos politécnicos, que têm, ao longo dos últimos anos, aumentado os planos de estudo multidisciplinares e cursos para a educação de adultos, permitindo a adaptação ao mercado de trabalho.

Entre 1994 e 1996, foi adoptada em grande parte das universidades uma estrutura bietápica para a quase totalidade dos cursos, tendo como objectivo estabelecer uma estrutura de formação internacionalmente compatível, dando aos alunos a possibilidade de desenvolver os seus estudos, não só de um modo multidisciplinar como também em diferentes instituições.

Relativamente à distribuição do financiamento, o Governo determinou que esta será efectuada tendo sempre em conta a relação entre a qualidade do projecto e o financiamento exigido. Relativamente a novos projectos, as instituições deverão procurar apoio financeiro, assegurando uma correcta distribuição interna dos fundos e a racionalização dos gastos. No entanto, procura-se sempre atribuir à instituições um financiamento estável, de modo a que estas possam produzir resultados satisfatórios e envolver-se em projectos a longo prazo. O financiamento das instituições baseia-se em critérios de qualidade, como o potencial da instituição, a capacidade de colocar os seus formados no mercado de trabalho e o grau de concretização dos projectos propostos. O volume de financiamento proveniente de fontes externas, nomeadamente internacionais, irá aumentar consideravelmente.

Ao longo dos últimos anos, o ensino superior na Finlândia tem vindo a desenvolver-se com base em dois sectores paralelos: o sector universitário e o sector politécnico.