“Europa-África. E vice-versa?
A propósito da Cimeira Europa-África é importante analisar um conjunto de preconceitos históricos que, tomando novas formas, continuam a marcar a imagem global que a Europa –ou muitas das suas populações, medias e governos - tem em relação ao continente africano. Estes preconceitos constituem um obstáculo para o conhecimento concreto da pluralidade da realidade africana, particularmente em termos culturais, e são a razão maior que impede uma urgente alteração dos modos de cooperação e negociação cultural possíveis com muitos dos países africanos. São principalmente três os preconceitos europeus em relação a África: a) a ideia de uma total homogeneidade nos países africanos, cujo cliché mais explícito se traduz na afirmação “o continente negro”; b) que, não tendo história no período pré-colonial, é um continente apenas de “natureza”, sem práticas e tradição culturais c) a negação aos africanos de se poderem relacionar culturalmente com a sua contemporaneidade por falta de capacidade.
Em relação ao primeiro preconceito, um conjunto de factos concretos e objectivos e a análise de estatísticas produzidas pelas mais incontestáveis instituições ocidentais, como o Banco Mundial, Human Development Report e vários investigadores independentes, contrariam-no radicalmente. Continente habitado por mais de 800 milhões de pessoas, distribuídas por 53 países, a África é de uma diversidade invulgar, com países e populações que podem ser entre si, tão ou mais substancialmente diferentes do que as diferenças que se podem encontrar entre Portugal e a Finlândia, a Espanha e a Polónia, ou a Suiça e a Grécia. Alguns factos e números comprovam-no: enquanto a Gâmbia é um pequeno país de 11.000Km2, o Sudão é 250 vezes maior; a Nigéria tem uma população de 120 milhões de pessoas, enquanto o Lesoto tem apenas 2 milhões de habitantes; se a Etiópia é racialmente homogénea, na África do Sul há dezenas de comunidades étnicas. O norte do continente é predominantemente muçulmano, enquanto o sul é maioritariamente cristão e, para os que pensam ser África um continente de temperaturas abrasadoras e chuvas tropicais, é importante saber que as diferenças climáticas alternam entre secas anuais permanentes, como em Cabo Verde, no Saara ou no deserto da Namíbia, e as pluviosidades recordes, como na Gambia e nos Camarões, e que no mesmo país, o arco de temperatura pode ir dos 17ºC negativos nas altas montanhas da Eritreia, aos 50º C na depressão de Danakil. Entre os 53 países há monarquias (Marrocos, Suazilândia, Lesoto), regimes democráricos (Cabo Verde, Moçambique, Tunísia, África do Sul, etc) e ditaduras, de que o regime do Zimbabué é o exemplo mais flagrante. Se nos confrontarmos com números, as disparidades também são enormes, como entre o maior PIB, da Guiné Equatorial – 50.012 Usd –, e o menor, 600 Usd, na Somália; entre a taxa de alfabetização de 85% na Namíbia, e a de 12,8% no Burkina Faso; entre os 212 médicos por 100.000 habitantes no Egipto, e 1 médico para o mesmo número de habitantes, no Malawi; ou como entre os 5 milhões de utilizadores da internet na África do Sul, e os 1.000 na Libéria. Não há semelhanças possíveis, o que nos deve alertar para a diversidade total e em todos os domínios destes países, e que confirma que os discursos sobre África, que a homogenizam através de uma imagem radicalmente negativa, têm sido condicionados por uma percepção externa e muito limitada aos interesses e discursos do Mundo Ocidental e de alguns governos africanos aos quais interessa uma imagem que justifique apoios, perdões da dívida, etc. No caso da Europa, esses discursos e essa percepção provêm de ex-colonizadores ainda à procura de encontrar uma relação histórica liberta de traumas e de modelos rígidos de cooperação. Mas, tal diversidade deve implicar desde já uma relação diferenciada com os países e os governos em termos políticos e em termos de cooperação estratégica e, sobretudo, deve obrigar a estudar e conhecer muito melhor as suas sociedades civis, o que é fundamental para explicar as políticas de África.
Em relação ao segundo preconceito, de que todo o “continente africano se reduz à natureza e não tem cultura”, esta fórmula hegeliana tinha já justificado os vários colonialismos, serviu de pretexto à Conferência de Berlim de 1884/85, adiou as independências, e é hoje ainda sob esta percepção que todo o continente é olhado. Títulos de jornais como “África, um continente de matérias primas” e “África um continente inesgotável de recursos naturais”, ou as cimeiras, cujas agendas são maioritarimente de natureza comercial ou obcessivamente sobre o ambiente, estão condicionadas por esta percepção redutora. E, no entanto, tal percepção, para além dos interesses (também de muitos governos africanos) revela igualmente uma enorme igorância sobre as histórias culturais do período pré-colonial e mesmo sobre as do domínio colonial. O estudo das sociedades pré-coloniais revela a grandeza, a subtileza e a complexidade cultural de muitos destes povos: desde a estatuária egípcia, a escrita e a invenção da aritmética, ao legado grego e romano na Tunísia. No antigo reino do Congo podemos observar a riqueza da produção de joalharia, de adornos guerreiros, de mobiliário, da confecção têxtil, assim como a organização política e a diversidade linguística; as regiões da África ocidental (hoje Gana e Mali) foram construídas a partir dos benefícios e de um comércio proveniente da rota Saariana,com as respectivas produções culturais daí decorrentes (línguas, artefactos, moeda, mapas); nas regiões férteis do Nilo e dos Grandes Lagos (antigo reino do Uganda) floresceram impérios cujo domínio se deveu à perícia do trabalho em metais; o antigo reino do Zulu no Sul era afamado pela organização militar, fabricação de armas e de joalharia e os Massai - “The lords of the rift” - eram os banqueiros dos planaltos das terras onde hoje é o norte de Moçambique, Tanzânia, Mallawi, Zâmbia. E quem visite o Museu de Lagos, na Nigéria, confronta-se com os delicados baixos-relevos das portas relatando cenas do quotidiano e fauna local, majestosamente talhadas, ou as cerâmicas de Nok, com as cabeças esculpidas com rostos serenos e triangulares, de narinas muito abertas.
Acresce que durante o período pré-colonial, até à Conferência de Berlim, as fronteiras eram móveis e as migrações internas constantes, o que provocava contactos comerciais, linguísticos e culturais invulgares (a este propósito, vale apena ler o majestoso livro “Vou lá visitar os pastores” do antropólogo angolano Ruy Duarte de Carvalho). Deve dizer-se, aliás, que se o primeiro colonialismo, até 1885, foi danoso para os povos africanos, o que de facto veio a revelar-se destrutivo foram as decisões tomadas na Conferência de Berlim, onde se criaram fronteiras a régua e esquadro, sem qualquer tipo de consideração pelas organizações tribais, pela circulação de pessoas e animais, pelas migrações sazonais, as línguas, as relações entre os povos e com um total desprezo pela história cultural destes povos. À Conferência de Berlim se deve a produção da amnésia cultural do período pré-colonial africano.
Mas, se o desconhecimento da história cultural pré-colonial é ainda um facto na Europa, e mesmo em África, o mesmo pode dizer-se do período colonial, até às independências. E, contudo, para quem gosta de teatro ainda hoje é possível maravilhar-se com essa forma inovadora e ancestral do Tchiloli de S. Tomé e Príncipe, ou quem gosta de escultura em madeira ou pedra, pode admirar colecções de arte Makonde de Moçambique. Quantos conhecem, sabem e estudam a literatura nigeriana nigeriana da década de 1950, entre cujos nomes maiores se encontram D.O. Fagunwa (que escrevia em Yoruba), Amos Tutuola, Cyprian Ekwensi e mesmo Chinua Achebe, apesar deste último de ser considerado como o fundador da literatura africana de expressão anglófona? Saberão, os que estudam a história de arte do século XX, e em particular o movimento CoBra, de ruptura artística fundamental na Europa, que um dos seus mentores foi o sul-africano Ernest Mancoba, ainda recentemente excluído de uma retrospectiva deste movimento no Stedeljik Museum na Holanda?! Quem sabe que ainda, actualmente, depois de vários séculos, se pintam ícones na Etiópia segundo a técnica e a composição de provável e remota influência bizantina e da escola Andrei Rubliov? E se não podemos, de facto, falar da presença do teatro como género africano, devemos ter presente a importância dos “griots” e dos seus relatos orais que foram responsáveis pela transmissão de narrativas cosmogónicas de inspiração africana e de narrativas morais e políticas, num continente que durante séculos assentou na oralidade o seu património cultural. Quem conhece o Goree Instituto em Dakar, dirigido pelo poeta sul-africano Breyten Breytenbach, e a sua importância como Centro Cultural, desenvolvendo um programa de arquivos para a preservação da história cultural do período da luta pela independência, e projectos de difusão cultural? Este desconhecimento é uma das causas da redutora visão ocidental que, por sua vez, tem parte da sua justificação na ausência de narrativas escritas e da falta de uma massa crítica mais substancial de africanos capazes de lidarem com o seu próprio passado, e isentos de algum fundamentalismo pan-africanista. Outra justificação para esta ignorância passa pelos dogmas ocidentais contidos na História Ocidental (da política, das nações, da arte, da economia, etc).
Se considerarmos o que é hoje a actualidade africana na sua enorme diversidade, verificamos que não só oferece casos de estudo fascinantes, como recorda o africanista Alex Thomson, mas obriga, por imperioso dever de cidadania mundial, a rever a percepção deste continente. Apesar da corrupção em muitos dos países (com a cumplicidade do Ocidente, porque não há corruptos sem aqueles que os corrompem), apesar do flagelo da Sida, apesar de 40% da população viver apenas com 1 Usd por dia, apesar do avanço do Islamismo para o Sul, apesar de tudo isto, comparem-se os 30 anos de média destas independências com outros países independentes há dois séculos… Em trinta anos alteraram-se regimes e criaram-se democracias. Há hoje lideres africanos de relevância mundial fundamental, como Nelson Mandela, Thabo Mbeki, Hosni Mubarak, e Abdoulaye Wade, que criaram como prova de outro desejo de desenvolvimento o New Partnership for African Developmente/ NEPAD, cujos objectivos principais são a eliminação da pobreza, o combate à marginalização de África na arena global, e acelarar o poder das mulheres. Há cidades que se desenvolvem a um ritmo impressionante; há Pedro Pires em Cabo Verde, há Ellen Johnson Sirleaf, primeira mulher presidente na Libéria e outros.
E há uma pulsão criativa e uma energia cultural únicas, que um calendário breve, de Novembro e Dezembro deste ano, confirma: o Festival de artes visuais de Abijan, a 31ªa edição do festival internacional do filme do Cairo, os 7ºs Encontros Africanos de fotografia de Bamako, a 5ª edição do Festival Internacional de Dança Contemporânea de Bamako, a 6ª edição do Festival Internacional nigeriano da Moda Africana, o Ife festival de Poesia da Nigéria (na sua 10ª edição), o concurso nacional de Hip Hop, em Dakar, a Bienal de Arte africana da Tanzania (na sua 3ª edição), a 10ª edição do festival de teatro da fraternidade do Togo, o primeiro Campus euro-africano de cooperação cultural euro-africana, no Maputo, o seminário de direitos dos artistas-autores, em Cotonou, a Plataforma internacional de dança contemporânea, em Maputo, o Festival de livros e arte em Lagos, no Accra – duas semanas de formação musical para filmes africanos, no Quénia, o Singalagala Festival, dedicado ás artistas-mulheres, no Egipto - festival de música árabe, nos Camarões o 7º festival do conto, e muitas outras manifestações e eventos culturais.
É evidente que esta programação abrange apenas alguns países e algumas cidades. Por isso insistimos na ideia de não falarmos do continente africano como um todo, mas da diversidade do seu desenvolvimento económico e cultural. A este calendário exclusivo de actividades das artes podemos acrescentar um conjunto de nomes de artistas, ou grupos, incontornáveis na paisagem criativa contemporânea, provenientes de diversos países. Da África do Sul, um importante grupo de artistas plásticos, como William Kentridge, Robin Rhode e Kendell Geers, entre outros, a produzirem do melhor que há depois do fim do apartheid da literatura e do ensaísmo africano ou o teatro do mesmo país de que se pode destacar a Handspring Puppet Company uma das melhores companhias de teatro do mundo, o poeta Breyten Breytenbach, a residir no Senegal; do Uganda, o movimento dos DVJ das discotecas, produtores e difusores do que mais inovador há na simbiose da música com o video e a poesia actuais e, simultâneamente, tradutores-intérpretes dos filmes em línguas estrangeiras; da Nigéria, a jovem literatura com nomes como Chimamanda Ngozi Adichie, que ganhou o Orange Broadband Prize for Fiction (2007); do Sudão, Leila Abouulela, a autora de Minaret; de Angola, a nova música de dança, com artistas a gravarem e circularem pelas cidades europeias, como Mc Kapa, Ikonoklasta e o performer Nástio Mosquito; de Moçambique, fotógrafos de reconhecimento internacional, como Ricardo Rangel, a quem o MoMa de Nova Iorque dedicou uma retrospectiva e participação permanente nos Encontros de Bamako e na Photofesta de Maputo de muitos destes fotógrafos, a cantora Lura de Cabo Verde, os fotógrafos Samuel Fosso (Camarões), Malick Sidibé (Mali), Nontsikelelo Veleko (África do Sul), os artistas plásticos Paulo Capela (Angola), Body Isek Kingelez e Chéri Samba (RDCongo), o novo movimento de videastas do Egipto, o teatro tunisino, os designers do Mali e do Senegal, etc.etc.
Embora esta lista não seja exaustiva, nem pretenda ser representaiva de todas as artes e literaturas contemporâneas dos países africanos, mesmo assim, ela é escassa. O que não significa que não existam géneros, como o teatro e o cinema, com fragilidades de produção e de qualidade interpretativa. Mas, se considerarmos que a idade média das independências destes países é de 30 anos, que a maior parte deles nasceu sem quaisquer tradições de formação artística, sofrendo o efeito de ruptura das suas mais ancestrais tradições por efeito do colonialismo, e que os seus primeiros anos foram, para a quase totalidade, marcados por governos desastrosos para as populações, que não dedicaram qualquer atenção aos aspectos culturais e artísticos, compreender-se-á a dificuldade de mapear uma criaçâo e produção artística estável. Acresce que o fenómeno da independência trouxe consigo um dos problemas mais complexos, embora não deixe igualmente de ser um desafio criativo, que é o da criação das identidades culturais e políticas e da relação negocial de cada comunidade com o legado do ex-colono. a acrescentar às dificuldades de meios de produção compreender-se á que a actualidade desta criação artística é substancial. Devemos notar ainda que a diáspora africana começa a ser uma das mais produtivas, nomeadamente nas áreas da música, da literatura e das artes plásticas. A ausência de escolas de formação, de um mercado, de circuitos, de produtores, de coleccionadores e de difusores é um problema com que se têm de confrontar diariamente estes criadores. É a este nível que a Europa estabelecer a sua cooperação, não só porque ela é fundamental para os africanos, mas também, porque no domínio da cultura e das artes como, de resto, na área da migração, ela é também essencial para o mundo ocidental. Estes criadores, pela energia criativa que transportam, pela ideia de futuro que contêm, exactamente fruto da sua procura de identidades e da sua posicionação face ao restante mundo, e pela capacidade sincrética que as suas obras traduzem, constituem mais valia para arte contemporânea.
A cooperação Europa-África em todos os domínios é, pois, uma questão central da relação entre os países destes continentes, tendo de ser avaliado tudo o que foi feito até ao momento e muito foi muito mal feito em muitos domínios. No último ano do seu mandato Tony Blair avançou com a ideia de um plano Marshall para África. É concerteza uma ideia a considerar com muito estudo e particular cautelas a tomar, a primeira das quais é considerar que a cooperação deve ser cada vez mais com as sociedades civis africanas e com as organizações credíveis que as representem, segunda passa por uma avaliação das Organizações ocidentais que têm elas próprias beneficiado alimentando as suas organizações, funcionários e parceiros de muitos dos recursos destinados á cooperação, e por último considerar que existem choques culturais e que é tão inválida a ideia de uma cooperação baseada nos modelos ocidentais como outra que afirme que a África resolve os problemas á africana; há um terceiro modelo conhecido como negociação cultural, o mais adequado a qualquer cooperação. Não deve haver grandes ilusões sobre o interesse e a importância que as matérias e as questões ditas culturais ou artísticas têm para os governantes de ambos os lados nos protocolos de cooperação tanto mais que só agora se deram conta da chinezização africana, mas vale a pena insistir a pensar no futuro.
No entanto se há casos de boa cooperação recentes eles têm acontecido também nestas áreas. E de um leque de pistas de trabalho possíveis será desejável que a cooperação cultural Europa-África se faça no registo e estudo das línguas africanas de modo a que se diminuam as perdas de línguas locais e com o estudo destas se contribua para compreensão do pensamento e da relação que as comunidades destas línguas falantes têm com o mundo. A este propósito, o trabalho do Ministério da Educação da África do Sul, que com apoios de organizações europeias já oficializou onze línguas nacionais, é exemplar; que se estimule e se faça um trabalho de pesquisa arqueológica nos países onde os vestígios das guerras o permitem, ele é fulcral para o conhecimento dos vários períodos da história de África e para conhecimento das migrações internas e externas; que se coopere no domínio da história das religiões e das formas sincréticas de culto e respectivas representações plásticas e musicais como também já começa a ser feito agora com recurso aos novos medias como é o caso das Igrejas Pentecostais muitas sediadas na Nigéria e utilizando websites sofisticados videos e filmes na sua comunicação.
A cooperação é desejável na transferência de lugares de desenvolvimento tecnológico de modo a permitir a criação de massa crítica, de desenvolvimento económico, de autonomia de recursos e de desenvolvimento estrutural. É sabido que o domínio das tecnologias implica um maior desenvolvimento científico e consequentes resoluções de problemas sociais e que a coperação universitária estimule não só uma transmissão de conhecimento Europa versus África mas que desenvolva e contribua para a formação de intelectuais, cientistas e artistas em África. Finalmente é fulcral, que a mobilidade dos artistas entre a África e a Europa seja possível sem os constrangimentos rigidos com que acontecem actualmente.
E Portugal no meio disto tudo? Portugal que tem o privilégio de contar entre os seus parceiros mais directos países como Cabo Verde e Moçambique considerados exemplares nas estratégias de desenvolvimento e particularmente produtivos nas áreas culturais?! E não deixa de ser estranho que apesar disto e apesar da relativa facilidade de estabelecer a comunicação entre interlocutores portugueses cabo-verdeanos e moçambicanos e mesmo entre outros cidadãos e organizações das ex-colónias, de ser neste momento a equipa que está à frente do MNE particularmente conhecedora dos problemas de àfrica e particularmente sensível os vários organismos de cooperação cultural que dela dependem não têm qualquer política cultural, e que mesmo no que respeito à língua a estratégia é difusa. E quandose insiste na lusofonia como reportório de valores lusos comuns a toda a comunidade de ex-colonizados e quando se tem uma política de divulgação cultural e artística nestes países baseada na ideia da divulgação dos valores e dos artistas e escritores portugueses estamos face a uma estratégia anacrónica. Se a lógica com que foram criados no período colonial estes instrumentos de difusão das culturas nacionalistas (Goethe, AFAA, British, Instituto de Alta Cultura – antecedente do Camões) hoje é anacrónico e absolutamente contrário a qualquer lógica de cooperação baseada no reconhecimento da cultura do outro. E no terreno a situação é constrangedora: aos conselheiros culturais portugueses nos países africanos falta formação e actualização, estão numa situação de abandono, sem estratégias a longo prazo, sem orçamentos (10.000 euros anuais é o orçamento anual que os centros culturais portugueses têm para actividades), obrigados a encontrarem mecenas para cuja função não tem vocação, nem obrigação e sobretudo condenados a difundirem a cultura portuguesa e de algum modo inibidos de colaborar com as organizações ou produtores de outros países europeus. Quando se sabe que em África os centros culturais dos vários países europeus constituem, por vezes, os únicos equipamentos de produção e difusão cultural, esta estratégia nacionalista é um erro e um impedimento à própria solidariedade e cooperação europeia em moldes pós-coloniais. Nos antípodas, encontramos os exemplos a seguir de centros culturais de outros países – escandinavos em particular - e os modelos exemplares do centro Cultural Franco-Moçambicano ou Francês, em Antananarive. Eles são, na verdade, plataformas de verdadeira cooperação cultural, com estratégias de produção, co-produção e programação culturais cuja qualidade é exemplar. Em qualquer um destes centros é possível um dia ver BD de vários autores africanos, outros dia espectáculos de dança de coreógrafos europeus e/ou africanos, ver cinema documental americano ou africano, ouvir música de vanguarda belga ou assistir a um concerto de marimbas. A cooperação cultural só é possível se houver entendimento e reconhecimento do outro e disposição deste outro para cooperar também segundo os seus interesses.”
Alguém Escreveu, um Público qq, Na Altura Da Cimeira Europa-África.
F-se! O Que Interessa É O Conteúdo y Não o Autor ( Seja Lá Ele Quem For) ...Ainda Há Quem Pense Y seja Português.